quinta-feira, 20 de março de 2014

Tec Toy: a estrela que sobe

A Tec Toy é uma empresa bem conhecida no Brasil entre os jogadores que viveram nas décadas de 80 e 90. Ela foi responsável pelo estabelecimento da liderança da Sega no mercado brasileiro de videogames durante esse período. Hoje, trago-lhes um artigo de 1992 da revista Exame sobre a ascensão da empresa, que caminhava para a liderança do mercado de brinquedos, ultrapassando sua rival: Estrela.

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Acima, vocês podem ver a capa da revista. Suas medidas originais são: 21 cm x 27,5 cm. As imagens mostradas aqui foram escaneadas com a resolução de 1200 ppp (pixels por polegada) e têm as medidas de 3500 x 4570 pixels. Confiram mais detalhes sobre ela e a reportagem de capa nas linhas seguintes!

Índice:
1. Capa
2. Páginas 98 e 99
3. Páginas 100 e 101
4. Páginas 102 e 103
5. Links
6. Comentários dos leitores

1. Capa

Como vocês podem ver no topo da capa, há uma linha vermelha que destaca duas notícias: "A vida dos executivos longe do poder" e "Quando compensa associar-se à mulher". O primeiro artigo fala sobre executivos que perderam seus empregos, e o segundo conta a história de maridos que deixaram seus empregos para trabalhar na empresa de suas esposas.

Abaixo da linha vermelha temos o nome da revista, Exame. Sobre o nome, há o título de um outro artigo: "A lista dos 50 maiores grupos", sobre os 50 maiores grupos empresariais do Brasil na época. À esquerda do nome da revista há as seguintes palavras: "exemplar de assinante" e "venda proibida". Na linha vermelha abaixo do nome da revista está escrito: "Edição 519", "Ano 24 - Nº 24 - 25/novembro/92" e "Cr$ 35 000,00". "Cr$" significa Cruzeiro, que era a moeda na época. O preço da revista é equivalente a aproximadamente R$ 21,00 hoje.

Dentro do balão amarelo está escrito: "EXCLUSIVO: Quanto as maiores empresas recolheram de impostos federais em setembro".

Abaixo do preço da revista está a logomarca da editora, a Abril, em branco.

No centro da capa, há a imagem de uma criança jogando Sonic the Hedgehog em frente a TV. A legenda da imagem diz: "O herói Sonic no Mega Drive".

Abaixo da imagem, a manchete é:
TEC TOY
A ESTRELA QUE SOBE
Graças aos videogames, um grupo de executivos constrói em cinco anos a empresa de brinquedos que mais cresce no país
Nesta manchete há um trocadilho com o nome da rival da Tec Toy, a Estrela.

2. Páginas 98 e 99

Imagem da página 98 da edição 519 da revista ExameImagem da página 99 da edição 519 da revista Exame
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A reportagem de capa é apresentada nas páginas 98-103. No topo dessas páginas podemos ver as palavras "REPORTAGEM DE CAPA" sobre uma linha vermelha. No rodapé das páginas 100-103 está escrito: "Exame, 25 de novembro de 1992." Vamos começar com as páginas 98 e 99. A manchete, que se estende por duas páginas, diz:
O TRIUNFO DE UMA BRINCADEIRA
No rastro da febre dos videogames, a Tec Toy sai do nada para em cinco anos ameaçar a liderança cinqüentenária da Estrela


Página 98

Na página 98 há uma imagem com brinquedos produzidos pela Tec Toy. Sua legenda diz:
É SÓ ESCOLHER
Opções da Tec Toy: além dos games, de bonecas a pré-computadores
Infelizmente eu não tenho informações sobre o brinquedo que se parece com um sapo/dinossauro, então não posso dizer nada sobre ele. Mas o resto dos brinquedos são (de cima para baixo):
  • Quero Carinho: bonecas que tinham uma voz eletrônica e pediam por carinho.
  • Tele Papo: um aparelho telefônico com uma caderneta de telefones. Chamando um dos números, as crianças podiam ouvir diferentes personagens, vozes de animais e canções.
  • Xuper Pião da Xuxa: um pião com o nome da apresentadora homônima. Há duas versões que tocavam diferentes canções instrumentais. Um, quando girado, tocava parte da canção Ilariê, e outro tocava parte da canção Pinel por você.
  • Mr. Show: um boneco vestido como um apresentador de um game show. O brinquedo tem um vocabulário de 700 palavras e 4 diferentes jogos ("Frases Famosas", "Jogo do Reflexo", "Adivinhe a Palavra" e um "Jogo de Perguntas"). Para o jogo de perguntas, uma fita cassete (que vinha inclusa no pacote) era necessária.
  • Master System III Compact: uma versão brasileira do console de videogame da Sega. Duas versões foram vendidas: inicialmente uma com o jogo Alex Kidd in Miracle World incluído na memória do console, e então outra que vinha com Sonic the Hedgehog embutido, substituindo a anterior. Na época da publicação desse artigo, a versão que estava nas lojas era a primeira.
  • Pense Bem: era um pré-computador destinado a crianças com idades entre 5 e 8 anos. Licenciado pela VTech, ele ensina princípios básicos de matemática, notas musicais e mais. Livros de atividades (livros contendo questões) podiam ser comprados separadamente para serem usados com ele, expandindo o número de atividades do computador.
  • Estrelinha Mágica: um brinquedo baseado em um personagem da Turma da Mônica. Era uma pequena estrela com dois sensores que quando tocados, produziam um som eletrônico e a faziam brilhar.
No centro das páginas 98 e 99 há uma foto com a seguinte legenda:
Dazcal, com Sonic no colo, Arnhold (à esq.), Blatt e Fontella: sucesso com brinquedos mais modernos e prestação de serviço à garotada
Das pessoas na foto, somente Arnhold continua a trabalhar na Tectoy. O fundador da empresa, Daniel Efraim Dazcal, morreu em 26 de maio de 1994 aos 42 anos.
Victor Blatt deixou a Tec Toy pouco após essa publicação para trabalhar na Elsys, uma empresa de componentes eletrônicos onde ele mais tarde se tornaria diretor-presidente. Ele morreu em 1 agosto de 2012 aos 68 anos.
Não há muita informação sobre Nelson Fontella Gonçalves. A última informação que pude encontrar é de 2007, quando ele foi contratado como diretor de negócios de TI na Network1, uma distribuidora de produtos de comunicação e segurança digital.
Stefano Adolfo Prado Arnhold é o atual presidente do conselho da Tectoy. Ele é também um atleta, tendo vencido mais de 10 campeonatos brasileiros de esqui alpino, e é o atual presidente da Confederação Brasileira de Desportos na Neve.

O engenheiro argentino Daniel Dazcal, 41 anos, ajeita os óculos e respira fundo, pronto para mais uma partida de golfe. Vai participar do torneio Arnold Palmer, com outros quinze jogadores, num gramado paradisíaco, cheio de tanques de areia e lagos.[nota 1] Ele observa o vento e dá sua primeira tacada, precisa. É craque num hook ou num slice down, palavras que, no jargão do golfe, têm o mesmo significado de outras como gol, cesta ou pole position. Não chega a suar a camisa. Nem poderia, na verdade. Dazcal é um golfista de poltrona: ele vive as emoções do golfe diante de um aparelho de TV. Não se limita a tacadas, aliás. Pela tela da TV, acoplado ao videogame Mega Drive de quarta geração, ele viaja por campos de golfe, pistas de patinação e terrenos de bicicross, entre outros jogos eletrônicos. Vez por outra, embarca em aventuras na companhia do super-herói Sonic, o porco-espinho high-tech que capturou a admiração reverenciosa dos gamemaníacos espalhados pelo mundo. O que para todos é lazer e diversão, para Dazcal é trabalho duro, um negócio seriíssimo. Graças aos videogames, a Tec Toy, empresa da qual Dazcal é fundador, acionista e principal executivo, saiu do ponto zero para em cinco anos ameaçar a liderança cinqüentenária da veneranda Estrela.
A Estrela encerrou 1991 ainda no topo do pódio: faturou 180 milhões de dólares, contra 140 milhões da Tec Toy (receitas pelo critério adotado pela Abrinq. Pela Lei das S.A., o faturamento da Tec Toy foi de 110 milhões de dólares e o da Estrela, pouco mais de 130 milhões). Mas pela análise da evolução dos resultados das duas é provável que de lá seja desalojada agora. No primeiro semestre deste ano sua multidão de bonecas e jogos tradicionais foi atropelada pelos videogames e brinquedos eletrônicos da jovem rival. A Estrela vendeu, no período, 30 milhões de dólares. A Tec Toy, 56 milhões. O dinheiro entra na indústria de maneira irregular. As empre-

Página 99

sas colhem no primeiro semestre, em geral, 25% da receita anual. O melhor vem no segundo semestre, embalado por acontecimentos como o Dia das Crianças e o Natal. A perspectiva para a Estrela, depois dos 30 milhões de dólares no primeiro semestre, é fazer mais 90 milhões no segundo e chegar a 120 milhões. A Tec Toy, com uma linha de brinquedos menos vulnerável às oscilações erradias da sazonalidade, é uma exceção à regra. Costuma fazer 40% no primeiro semestre e 60% no segundo. A previsão, portanto, é que feche dezembro com 140 milhões de dólares, sagrada a número 1 dos brinquedos.
A TEC TOY DEVE ESTE ANO DEIXAR PARA TRÁS A ESTRELA

    
Ganhar mercado, ainda que com o sacrifício temporário das margens de lucro, parece ser a prioridade. Em 1991, por exemplo, a Tec Toy fechou seu balanço sem ganhos nem perdas. A receita da arrancada parece simples na boca de Dazcal. "Antecipamos o que a criança quer", diz ele, com um sotaque argentino que seus quase vinte anos de Brasil não conseguem disfarçar. "No nosso campo, a criança é o Ph.D."
O sucesso da Tec Toy é o triunfo da capacidade de ver na hora certa o que os outros só verão na hora errada. No Brasil ninguém enxergou tão bem quanto a Tec Toy as magníficas possibilidades oferecidas pela comunhão entre a eletrônica e os brinquedos. Numa época em que os fabricantes brasileiros ainda apostavam em caminhõezinhos e bonecas, a Tec Toy aliou-se à japonesa Sega, grande rival da também japonesa Nintendo no mundo dos videogames, e ensimesmou a garotada com as proezas de personagens como Alex Kidd e Sonic. Só agora, depois que a Tec Toy conquistou uma confortável dianteira nos games, é que a Estrela se esforça por fechar um acordo com a Nintendo. O que hoje parece óbvio não era tão óbvio

3. Páginas 100 e 101

Imagem da página 100 da edição 519 da revista ExameImagem da página 101 da edição 519 da revista Exame
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Página 100

Na parte superior das páginas 100 e 101 há uma imagem (por Regis Filho) com a seguinte legenda:
Clínica com crianças na sede da empresa, na Lapa, para colher opiniões sobre o brinquedo… …Pense Bem: os pais ficam de fora

OS DONOS DO COFRE
O quinhão de cada sócio da Tec Toy
60% Abe e Leo Kryss       30% Daniel Dazcal       10% Stefano Arnhold
Fonte: Empresa

assim quando a Tec Toy foi fundada, em 1987. "Essa geração prefere os videogames aos brinquedos tradicionais", diz Tomy Sun, diretor das lojas de departamentos Mesbla. Simples, banal até, tal frase diz tudo sobre o mercado de brinquedos. Explica o avanço da Tec Toy e o recuo da Estrela.
A corrida da Tec Toy para manter as crianças ligadas entra, agora, num momento dramático. Depois de fazer cerca de 180 lançamentos este ano, numa média de mais de três por semana, seu pessoal começou a contagem regressiva para colocar nas lojas, ainda em dezembro, a primeira cria de uma novíssima geração de videogames. É o Sega CD. Concebido pela Sega em seus laboratórios de Tóquio,
60% DO FATURAMENTO VEM DA LINHA DE VIDEOGAMES

    
o Sega CD leva os compact discs aos videogames Mega Drive e multiplica o potencial dos jogos em som, imagem e ação. Permitirá logo que eles sejam animados com personagens reais, em carne e osso, como atores de Hollywood e astros do rock. A Tec Toy tem de correr, porque nesse mercado os títulos de sucesso da Nintendo não pedem licença para passar ― entram no país aos milhares, seja pelo contrabando, seja na bagagem de turistas ― e os lançamentos ajudam a manter aceso o interesse não só da garotada mas também de um público crescente: os adultos. Os videogames, afinal, são feitos para qualquer idade.
As armas desses competidores, assim, utilizam-se cada vez mais do poderio derivado da tecnologia de informática. É o caso do Sega CD, que, depois de provocar filas às portas das lojas no Japão, no ano passado, estréia este mês nas prateleiras americanas. É possível que, antes do Natal, esteja no Brasil. "Vamos tentar entregar o Sega CD nem que seja no dia 24 de dezembro, às 3 da tarde", anima-se Stefano Arnhold, 38 anos, vice-presidente de negócios da Tec Toy. Arnhold é um dos sócios e o cérebro por trás da máquina de marketing da Tec Toy. Num país em que os avanços tecnológicos chegam com anos, às vezes décadas, de atraso, a Tec Toy esforça-se sempre por estar em linha com o que corre lá fora. Em seu catálogo de novidades estão engatilhados também os games para computador, assinados por algumas das software houses mais quentes do mercado de videogames, como a Electronic Arts, a Acclaim e a Virgin. A Tec Toy não importa simplesmente os produtos prontos da Ásia e os encapsula em embalagens brasileiras. Ela os produz em sua fábrica de Manaus, onde trabalham 600 operários. O que vem de fora são os componentes e a tecnologia, comprada de grandes nomes do mercado de brinquedos, como a Nikko, do Japão, e a Tiger, de Hong Kong.
A Tec Toy surgiu com vocação para o lazer baseado em alta tecnologia. Tudo se encaminhou nessa direção desde que o telefone tocou num dia de 1987 no escritório de Dazcal, logo depois que deixou o cargo de vice-presidente da Sharp. Do outro lado da linha estava Leo Kryss, dono da Evadin, fabricante dos televisores Mitsubishi. Superpotência entre os investidores nas bolsas de valores, Kryss abomina tanto os holofotes que jamais deixou uma foto sua ser publicada na imprensa. Ele soubera que Dazcal montara seu próprio negócio e tinha uma proposta a fazer. Queria que os dois pensassem em algo juntos. Dazcal foi três ou quatro vezes ao Japão e a outros países da Ásia buscar inspiração. Voltou convicto de que o ramo do entretenimento tecnológico, semivirgem àquela altura no Brasil, tinha tudo para explodir.

A Tec Toy começou a tomar forma, com uma fábrica em Manaus e sede no bairro da Lapa, em São Paulo. Leo Kryss e seu irmão Abe financiaram o empreendimento, que consumiu 5 milhões de dólares em seus dois primeiros anos de vida. Ficaram com 60% da empresa, que nunca mais precisou de aporte de capital. Dazcal entrou com seu próprio trabalho e com suas idéias, e por tudo isso ficou com 30%. Para ajudá-lo a comandar a

Página 101

Na parte de baixo da página 101 há uma tabela com as seguintes informações:

A MARCHA DOS
NÚMEROS
Evolução dos principais indicadores da Tec Toy ― valores em US$ milhões
Ano
Fabricante
Verba publicitária
Investimentos médios**
Número de funcionários
1992
140*
10
7,5
970
1991
140
10
5,0
1 500
1990
119
6
5,0
1 320
1989
66
4
2,5
1 000
1988
8
1
2,5
300
* Previsão ** A empresa divulga investimentos por biênio
Para 1992/1993: US$ 15 milhões Fonte: Empresa

Tec Toy foi buscar Arnhold na Sharp. Ele completou o quadro de sócios da empresa, aquinhoado com 10%.
Quando patrocinaram a criação da Tec Toy, os irmãos Kryss não entendiam nada de brinquedos. Não era um problema: entendiam de dinheiro, que era o que importava. Estabeleceu-se que acompanhariam os negócios a distância, o que fazem até hoje. Dazcal e Arnhold, que se jogaram na frente de batalha, também não eram propriamente doutores em brinquedos. Isso sim poderia ser um problema. O legendário executivo americano Alfred P. Sloan, que construiu em meados deste século a moderna General Motors, cunhou uma divisa antológica: "Pertenço à velha escola para a qual o conhecimento do negócio é indispensável ao sucesso da empresa". Sloan provavelmente não apostasse 1 dólar na Tec Toy ― mas se arrependeria. O que podia ser um ponto fraco acabou virando vantagem. Dazcal e Arnhold, sem os encarquilhados preconceitos do meio, descobriram oportunidades onde ninguém via nada. Ignoraram, primeiro de tudo, o tabu dos brinquedos eletrônicos. Muitos empresários do ramo achavam que incorporar chips aos brinquedos só dava dor de cabeça, por causa dos investimentos exigidos e das dificuldades com a assistência técnica. Em seu segundo ano de vida a Tec Toy já ganhara a vice-liderança. Na aliança com a Sega a Tec Toy encontrou uma espécie de alma gêmea, uma empresa nervosa, ávida por crescer. Este ano deve faturar mais de 3 bilhões de dólares, o dobro de 1991, contra os mais de 4 bilhões da Nintendo.
Dazcal e Arnhold são o corpo e a alma da Tec Toy. Engenheiro eletrônico fanático por ficção científica, Dazcal trata os brinquedos e games futuristas da empresa com a familiaridade de quem já devorou cada uma das páginas escritas por Isaac Asimov. Casado com Ruth, uma engenheira que ocupa o posto de diretora industrial da Tec Toy, pai de três filhos, ele testa as novidades da casa, mas recusa-se a dar a última palavra sobre o assunto. Afirma-se um defensor do trabalho de equipe e da delegação de responsabilidades. "O patrimônio maior da Tec Toy são as pessoas", diz. "Contratamos gente capaz de ter idéias." Quando a empresa era menor, ele entrevistava pessoalmente cada um dos funcionários que entravam para a companhia. Hoje, não tem mais tempo para isso.
Dazcal cuida das questões gerais da Tec Toy. Mas Arnhold comanda uma das partes vitais da empresa: é ele quem fica atrás da Sega para dar prioridade ao Brasil nos lançamentos mais quentes. Fala tanto com Tóquio que agora começou a aprender japonês. Dois filhos, casado com Luci, que trabalha na área de editoração gráfica da companhia, administrador de empresas por formação, Arnhold aproximou-se de Dazcal na Sharp. Ambos trabalhavam no setor de planejamento estratégico, assessorando o empresário Matias Machline. Quando Dazcal assumiu a vice-presidência da divisão de produtos de consumo da Sharp, Arnhold virou seu diretor de marketing. Nasceu nessa época um respeito profissional mútuo que os levaria a se tornar sócios na Tec Toy em 1987. Até cerca de um ano atrás, o primeiro escalão da Tec Toy se resumia aos dois. Agora a linha de frente está reforçada por outros dois executivos: Victor Blatt e Nelson Fontella. Blatt, 48 anos, é um cordobês que dirigiu a Sid Microeletrônica e saiu de lá, no primeiro semestre, para se tornar vice-presidente de operações da Tec Toy. Fontella, 40 anos, também veio da Sid para assumir em 1991 a diretoria comercial da empresa.
A Tec Toy não inovou apenas com seus games. Também no relacionamento com os lojistas protagonizou fatos novos. Estabeleceu um único preço para todo o comércio, sem fazer diferença entre o Mappin e o bazar da esquina. Alguns dos grandes varejistas reclamaram, mas os pequenos ficaram eufóricos. "Agindo assim,
EM 1992, OS LANÇAMENTOS DA EMPRESA JÁ PASSARAM DE 180

    
a empresa evita esmagar os menores", diz Arab Chafic Zakka, dono das lojas Preçolândia, de São Paulo. A Tec Toy rompeu ainda com a ortodoxia ao sugerir aos comerciantes os preços de venda ao consumidor, como fazem a Sega e a Nintendo em quase todo o mundo. Ganhou, assim, certo controle sobre as etiquetas nas lojas. Se não conseguiu até hoje padronizar os preços, pelo menos tem impedido liquidações de seus produtos a preço de banana ― um mal que corrói cruelmente a imagem das empresas. "Quando um brinquedo sai de moda a Tec Toy organiza as promoções, evitando o salve-se-quem-puder", diz Eduardo Armando, diretor operacional da rede de lojas de brinquedos D.B., de São Paulo. Para manter seu nome longe dos festivais de descontos, a Tec Toy dispõe-se a engolir prejuízos. Se um produto encalha, é mantido no estoque da própria fábrica ou dado a instituições de caridade, em vez de ser jogado como saldo no comércio. O Superpião da Xuxa jaz até hoje no estoque.
A Tec Toy mostrou a cara aos consumidores pela primeira vez no primeiro semestre de 1988, com todo o barulho que uma companhia novata poderia fazer. Só no filme de apresentação do produto número 1, a

3. Páginas 102 e 103

Imagem da página 102 da edição 519 da revista ExameImagem da página 103 da edição 519 da revista Exame
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Página 102

No centro da página 102 há uma imagem (por Regis Filho) com a seguinte legenda:
Hotline: dicas por telefone para ajudar os guris a superar os obstáculos mais difíceis dos jogos

pistola Zillion, gastou muito mais do que poderia ter de volta em vendas. Queria mostrar que faria diferença. A Zillion, fabricada com tecnologia da japonesa Sega, saiu fácil das prateleiras. "Ganhamos de 10 a 1 de uma pistola semelhante da Estrela, mas ela nem deve ter notado nossa presença", diz Arnhold. "Tinha centenas de brinquedos para cuidar, e nós só tínhamos um." O batismo de fogo não foi com a Zillion. Aconteceu com o Pense Bem, uma criação da Video Technology, de Hong Kong, a maior empresa de tecnologia educacional do mundo. O sucesso do Pense Bem fez da Tec Toy um nome a ser levado a sério no mercado. Não, ali não estavam amadores. "Ficamos com a imagem de empresa inovadora", diz Arnhold.
Saber o que vai na cabeça das crianças é fundamental para a saúde de quem produz brinquedos. A Tec Toy faz força para saber ― ainda que com freqüência o preço desse conhecimento seja uma algazarra infernal em sua sede. Volta e meia, um bando de garotos invade as salas da empresa para dar palpites sobre campanhas publicitárias, lançamentos, modificações nos produtos que já estão em linha. Nessas reuniões, chamadas de clínicas, só conta a opinião dos consumidores mirins. As mães ficam do lado de fora. "As consultas funcionam como prova dos noves das decisões dos nossos executivos", diz Vivien Gomez Navarro, gerente de serviços de marketing. Na agência de publicidade Fox, que cria os cerca de trinta comerciais levados ao ar pela Tec Toy ao ano, sonda-se o humor infantil das mais variadas maneiras. Roni Gotthilf, o dono da agência, é freqüentador assíduo de lojas e supermercados. "Já tem gerente da D.B. Brinquedos achando que sou um elemento perigoso, maníaco, de tantas vezes que passo por lá para observar o movimento", diz Roni. Para julgar suas campanhas, Gotthilf recruta juízes mirins em sua própria família: os filhos. "O que não é aprovado por eles não passa da porta da casa", diz.
A explosão dos negócios da Tec Toy veio com os videogames, com sua multidão de super-heróis, embates entre o Bem e o Mal, aventuras malucas e pura e simples pancadaria. Ela já despejou nas lojas 800 000 Master System, Mega Drive e Game Gear, videogames de terceira e quarta gerações. Seus computadores registram 2,5 milhões de jogos vendidos até o ano passado. Este ano eles devem vencer a barreira dos 3,5 milhões graças ao cartaz de personagens como o porco-espinho Sonic e Alex Kidd ― rivais de Mario Bros, o grande herói da Nintendo. Ao tomar conta da garotada, a febre dos videogames deu músculos de gente grande à Tec Toy. Hoje eles respondem por 60% das vendas da empresa.
Para alimentar o interesse das crianças e adolescentes pelos videogames, a Tec Toy usa uma parafernália de chamarizes. Organiza campeonatos com gamemaníacos nos shopping centers. Seus clubes de consumidores, o Master Club, que tem 70 000 sócios, e o Mega Club, com 30 000, divulgam os jogos mais quentes lançados. As informações saem numa publicação que cada associado recebe em casa todos os meses, gratuitamente. Quem pode resistir? Os clubes também servem para estimular a competição entre os gamemaníacos. São publicados os nomes dos superferas e seus recordes. Um serviço de dicas sobre os jogos, por telefone, batizado de Hotline, se encarrega de livrar os guris dos obstáculos mais complicados dos jogos. Quem resolve as charadas são garotos que mal saíram da adolescência.
Na intimidade com os gamemaníacos, a Tec Toy pretende construir um escudo anti-Nintendo. Mais uma vez ensaia-se produzir a marca no país. Os candidatos atuais à licença são a Estrela e a Gradiente. "A Gradiente é bem-vinda", diz Arnhold. "Não joga com a mão na bola e deve ajudar a fazer uma limpeza no mercado." Por limpeza entenda-se o combate ao comércio paralelo de videogames e jogos Sega e Nintendo trazidos de Formosa, Japão, Hong Kong e Estados Unidos. É um comércio que prospera principalmente por intermédio das locadoras de videogames de bairro.
A Tec Toy está movendo uma guerra contra as locadoras para impedir que qualquer produto Sega freqüente esse circuito informal. A empresa abriu fogo também contra importadores legalizados. "Somos os únicos detentores da marca no Brasil e os únicos com direito a comercializá-la", diz Dazcal. A Tec Toy já abriu mais de duas dezenas de processos na Justiça contra importadoras que não pensam exatamente
A TEC TOY ENCONTROU NA PARCEIRA SEGA SUA ALMA GÊMEA

    
assim. A coordenação das operações de guerra ao mercado paralelo está nas mãos de Nelson Fontella, diretor comercial. Ele já conseguiu interditar mercadorias com assinatura Sega em dez locadoras de São Paulo. No final do ano, pretende desfechar blitze gerais para flagrar outra leva de locadoras.
"Isso é abuso de poder econômico", diz o consultor Mário Câmara, ligado a distribuidora LKC, uma das empresas que anunciam subterfúgios a venda de produtos

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Na parte de baixo da página 103 há uma tabela com as seguintes informações:
OS FAVORITOS DA GAROTADA
Jogos de videogame mais vendidos pela Tec Toy ― em unidades

Fonte: Empresa
334 000
Alex Kidd
140 000
Jogos de Verão
129 000
Super Futebol
115 000
Double Dragon
90 000
Sonic the Hedgehog

importados da Sega. "A Tec Toy está mal adaptada a um mercado competitivo." Os importadores incomodam a Tec Toy porque, com um simples telefonema a Miami ou Tóquio, conseguem, em questão de dias, qualquer sucesso que apareça lá fora. Eles são tão ágeis que há meses vendem no Brasil o Sega CD. Até meados de novembro, o aparelho não estreara sequer nos Estados Unidos. "O que saiu no Japão está em uma ou duas semanas nas locadoras brasileiras", diz Regina Giannetti, redatora-chefe da revista Ação Games, da Editora Azul.

Mas a pedra no sapato do pessoal da Tec Toy é mesmo o contrabando. Nos Estados Unidos, compra-se o Genesis, o equivalente americano do Mega Drive, com uma nota de 100 dólares. No Brasil, na mão de contrabandistas, o videogame pode ser arrematado por 150 dólares. É uma tentação para o consumidor. Um Mega Drive que sai da fábrica da Tec Toy em Manaus fica em pelo menos 250 dólares. "Sem a concorrência do contrabando, a empresa poderia vender no mínimo o dobro do que comercializa hoje", afirma André Nudelman, da rede paulista de locadoras Supergame. Durante quatro de seus cinco anos, a Tec Toy viveu no melhor dos mundos. "As pessoas faziam fila para comprar nossos produtos, e nos considerávamos o máximo", diz Arnhold. Quandos as coisas ficaram realmente pretas no mercado de brinquedos este ano, foi preciso esquecer a auto-admiração e se mexer. No esforço de não deixar cair o faturamento de 140 milhões de dólares do ano passado, os executivos dispararam baterias de promoções. Começaram, por exemplo, a financiar os lojistas para que estes entregassem os produtos da Tec Toy aos consumidores em seis suaves prestações mensais.
Pela primeira vez na história da empresa, houve cortes de pessoal em 1992. Mais de um terço dos funcionários foi ceifado. Eles caíram de 1 500 para 970, em nome da economia de custos, da busca de eficiência e de uma maior agilidade. Várias operações foram terceirizadas. Antigos funcionários de espírito mais empreendedor receberam incentivo para montar suas próprias companhias e prestar serviços para a Tec Toy. "A empresa precisava organizar-se para continuar crescendo", afirma Victor Blatt, recém-contratado executivo incumbido de tocar as mudanças. "Não dava mais para todo mundo correr para pegar qualquer bola."
A trajetória vitoriosa da Tec Toy numa época particularmente tenebrosa encerra lições que estão longe de se circunscrever ao mundo dos brinquedos. A principal delas talvez seja a de que, para o empreendedor atilado, as oportunidades continuam a existir ― ainda que em menor número e menos grandiosas. Muitos empresários gastaram boa parte de seu tempo, nos últimos anos, queixando-se da vida. Motivos, a partir dos desatinos em série fabricados em Brasília, não lhes faltaram, a rigor. Mas muita gente ávida por empreender concentrou o melhor de suas energias exatamente nisso ― empreender. Foi o que fizeram, por exemplo, Luiz César Fernandes e seus jovens sócios do Pactual, que na Década Perdida ergueram um banco de primeiríssima linha. Foi o que fizeram, também, Dazcal e Arnhold na Tec Toy, apoiados pelo dinheiro dos irmãos Kryss. Empreender, empreender e ainda empreender: essa foi, é e sempre será a melhor divisa do sucesso.
SANDRA CARVALHO

A NINTENDO ESTÁ AÍ
Para o empresário Mario Adler, 53 anos, a Estrela foi, é e sempre será a líder do mercado de brinquedos brasileiro. As recentes quedas no faturamento da empresa que ele preside e da qual é o principal acionista aparentemente não o abalam. Nem a arrancada da Tec Toy. Para Adler, videogames não significam brinquedos e nenhuma das outras empresas que fabricam peças similares às da Estrela chega perto da sua companhia. "Falar que a Tec Toy passou a Estrela é bobagem", diz ele. "A Tec Toy é líder, sim, mas em videogames. Não estamos nem um pouco preocupados com a sua atuação."
A crise econômica, aliada à mania por brinquedos eletrônicos que tomou conta das crianças, vem ferindo a Estrela. Seu faturamento caiu de 300 milhões de dólares em 1989 para 180 milhões em 1991. No primeiro semestre deste ano, as vendas estancaram em 30 milhões de dólares. Se a sazonalidade tradicional no setor de brinquedos ― 25% das vendas no primeiro semestre e 75% no segundo ― se repetir no caso da Estrela, a empresa fecha 1992 com 120 milhões de dólares. Se as previsões mais otimistas de Adler se confirmarem, o faturamento bate em 160 milhões de dólares. A Estrela tem-se mexido para contornar a crise. Reestrutura-se para ganhar mais eficiência e passou a tesoura nos custos. O destino do dinheiro economizado é certo. "Cada centavo será repassado para os preços dos brinquedos", diz Adler. "Queremos vender com a mesma qualidade mas com preços cada vez menores." Para fazer os negócios voltar a crescer, Adler aumentou a produção de brinquedos eletrônicos. Dentro de poucos dias, deve anunciar oficialmente a formação de uma joint venture com a Gradiente para produzir no país os videogames Nintendo. Nesse caso, a Tec Toy que se cuide. A briga será feia.

                                    

5. Links

Notas:
  1. ^ Essa frase se refere ao jogo do Mega Drive Arnold Palmer Tournament Golf.
Leitura complementar:
Tectoy – O sítio oficial da Tectoy;
Hardcore Gaming 101: Games of the World Em inglês – Uma entrevista de John Szczepaniak com Stefano Arnhold sobre a história da Tec Toy.


Referências:
Texto:
Como funciona o conversor de valores - noticias - O Estado de S. Paulo - Acervo Estadão – Instruções do conversor de moedas no sítio do Acervo Estadão;
Xuper Blog: Pião da Xuxa – Entrada de blogue com informações sobre o pião da Xuxa;
Pakéquis: Por dentro do Pense Bem da Tectoy – Entrada de blogue com informações sobre o "Pense Bem" da Tec Toy;
Kids' computers through the ages - ComputerworldUK.com – Apresentação de slides com computadores de crianças do passado;
Arquivos Turma da Mônica: Personagens Esquecidos 5: Estrelinha Mágica – Entrada de blogue com informações sobre a personagem da Turma da Mônica "Estrelinha Mágica";
Daniel Efraim Dazcal – Wikipédia, a enciclopédia livre
Folha de S.Paulo - Cotidiano - Argentino que escolheu o Brasil - 05/08/2012;
Nélson Fontella é novo diretor de negócios de TI da Network1 - IDG Now!;


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7 comentários:

  1. Obrigado Eduardo. Seu texto foi fundamental para que eu pudesse escrever meu post. Valeu mesmo!
    Ulisses 8 Bits

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    1. Muito obrigado pela visita, Ulisses! Fico realmente feliz em ter sido útil!

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    2. Eu é que agradeço, Eduardo. Você acredita que nem mesmo a exame . com possui as edições anteriores a 1999. Nem a capa os caras digitalizaram. Um grande abraço Eduardo. Muito obrigado!

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  2. Respostas
    1. Muito obrigado pela visita, Scant Tales! Agradeço-lhe deveras pelo elogio!

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  3. Alguem poderia informar a causa da morte do fundador da Tec toy? O Daniel Drazcal?? Já procurei em diversas páginas mas não encontro.

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    1. Olá, Rodri seixas! Muito obrigado por comentar.
      Daniel Efraim Dazcal faleceu devido a um câncer, como você pode ver neste artigo de nome "Tec Toy investe em 300 lançamentos", publicado na edição de 22 de março de 1995 do Jornal do Brasil.
      Realmente essa informação não foi muito divulgada. Na nota de falecimento publicada na Folha de S.Paulo, por exemplo, havia somente o local e horário do sepultamento, sem divulgar a causa da morte, assim como não encontrei texto algum que relatasse o tipo de câncer que ele teve.
      Bem, espero tê-lo ajudado!

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